Se você acompanha o cenário político, provavelmente já ouviu a frase: “a campanha eleitoral tem 45 dias”. Para o eleitor comum, essa é a percepção. É quando a propaganda na TV começa, os santinhos aparecem e o “vote em mim” se torna onipresente.
Mas, para um estrategista, para um candidato que realmente entende o jogo, essa é uma ilusão perigosa.
Se você só começa a “fazer marketing” quando a campanha oficial é autorizada, você não está disputando uma eleição; você está apenas participando dela. O marketing eleitoral moderno é uma maratona, e os 45 dias oficiais são apenas o sprint final.
Hoje, vamos desmistificar a “pré-campanha” e entender por que o verdadeiro trabalho de construção de imagem, autoridade e base de eleitores começa muito, muito antes do primeiro dia oficial.
A “Miopia Eleitoral”: Por que Esperar é um Erro Fatal?
Muitos candidatos acreditam que, por conta das restrições legais (como o pedido explícito de voto), não há o que fazer antes do período permitido. Isso é um erro estratégico colossal.
O período oficial é caracterizado por um ruído ensurdecedor. Todos os seus concorrentes estão falando ao mesmo tempo, disputando a atenção de um eleitor já cansado e cético.
Se você espera esse momento para se apresentar, você é apenas mais um rosto na multidão.
O Algoritmo Não Perdoa “Paraquedistas”
No marketing político digital, as redes sociais são o principal campo de batalha. E os algoritmos (do Instagram, Facebook, TikTok, etc.) têm uma regra clara: eles priorizam conteúdo de quem já possui uma audiência engajada.
- O “Paraquedista”: É o candidato que cria um perfil um mês antes da eleição, começa a postar freneticamente e, por vezes, impulsiona (paga) todo o conteúdo. O resultado? Baixo engajamento, custo por clique altíssimo e pouca entrega orgânica. O algoritmo o vê como irrelevante.
- O “Construtor”: É o candidato que, um ou dois anos antes, já estava lá. Ele não pedia voto, ele entregava valor. Ele falava sobre os problemas do bairro, explicava projetos de lei, mostrava seu dia a dia e construía uma comunidade. Quando a campanha começa, ele não precisa “comprar” atenção; ele já a possui.
Confiança: O Ativo que Não se Constrói em 45 Dias
Pense na sua própria jornada de compra. Você compraria um carro de alguém que você nunca viu na vida e que apareceu na sua porta gritando “compre meu carro, é o melhor!”? Provavelmente não.
A política é uma “venda” muito mais complexa. Você está pedindo o bem mais precioso do cidadão: seu voto, sua confiança e o futuro da sua cidade ou país.
A pré-campanha é o período de “nutrição” dessa confiança. É quando o candidato prova, por A+B, que entende dos problemas, que tem autoridade no assunto e que é uma figura confiável.
O Que Fazer na Pré-Campanha Digital: O Jogo de Longo Prazo
Se o período oficial é para a colheita (pedir o voto), a pré-campanha é para o plantio. É um trabalho meticuloso de estratégia digital.
Aqui está o checklist essencial do que deve ser feito “muito antes”:
1. Definição Estratégica e Posicionamento
Antes de ligar a câmera, responda:
- Quem é você? Qual é a sua história (storytelling)?
- Por que você? Qual é o seu diferencial claro?
- Para quem você fala? Defina suas “personas” (o eleitor ideal). Um erro comum é tentar falar com “todo mundo” e acabar não se conectando com ninguém.
- Quais são suas bandeiras? Defina 3 ou 4 pilares centrais que guiarão toda a sua comunicação.
2. Construção de Autoridade (Marketing de Conteúdo)
Este é o coração da pré-campanha. O objetivo não é pedir voto, é ser útil.
- Eduque: Se você quer ser vereador e sua bandeira é a educação, crie conteúdo sobre os desafios das escolas locais, explique como funciona o orçamento da educação, entreviste professores.
- Informe: Mostre os bastidores do seu trabalho (se você já tem mandato) ou da sua atuação na comunidade.
- Posicione-se: Dê sua opinião (com embasamento) sobre temas relevantes para seu público.
3. “Social Listening” (A Escuta Ativa)
O período pré-eleitoral é o melhor momento para ouvir, não apenas para falar.
- Monitore o que as pessoas estão reclamando nas redes sociais.
- Leia os comentários nas páginas de notícias locais.
- Quais são as dores reais do seu eleitorado? Use esse “data mining” para ajustar seu discurso e suas propostas.
4. Construção de Base (Captação de Leads)
Seguidor no Instagram não vota. O que define uma campanha digital forte é a capacidade de falar diretamente com o eleitor.
- Crie “iscas digitais”: um e-book simples sobre “Como fiscalizar o orçamento do seu bairro”, um grupo de WhatsApp para receber notícias em primeira mão.
- O objetivo é capturar nome, e-mail e, principalmente, WhatsApp.
- Essa base de contatos diretos (leads) será seu ativo mais valioso no período eleitoral, permitindo uma comunicação direta e segmentada, fugindo da ditadura do algoritmo.
O Marketing Eleitoral é Estratégia, Não Sorte
A campanha oficial de 45 dias é apenas a ponta do iceberg. O que sustenta uma vitória é a estrutura massiva de planejamento, conteúdo, análise de dados e construção de comunidade que acontece nos bastidores, meses ou até anos antes.
O marketing político digital profissionalizou a política. Acabou o tempo do improviso e do “carisma” como único pilar. Hoje, vence quem entende de narrativa, domina os dados e, acima de tudo, respeita o timing da jornada do eleitor.
Quem começa cedo, não constrói apenas uma campanha; constrói um legado de autoridade.